terça-feira, 11 de março de 2014

Pela liberdade, desde que necessária e simpática

Eu costumo dizer aos meus colegas professores que precisamos apoiar os que são contra a educação, porque está claro que apoiar os que são a favor não está dando muito certo. Brincadeira, obviamente. Mas é curioso como ninguém, absolutamente ninguém, da esquerda, da direita ou do alto, fala sobre educação sem usar palavras como "essencial" ou "prioridade". Sabemos disso professores, alunos, ex-alunos, os que nunca estudaram, e sobretudo os políticos, aparentemente. E tudo continua. 

Assim como não há quem seja contra a educação, nunca conheci alguém contrário à liberdade de expressão. Acreditamos todos na liberdade. Exigimos liberdade. Repudiamos a censura. O diabo é que sempre vem um "mas". Encontramos, assim, os curiosos conceitos da liberdade da expressão necessária, e liberdade da expressão simpática.

É particularmente estranha a posição de defesa da liberdade de expressão, desde que ela seja "necessária", seja lá o que isso possa significar. Ataca-se assim, principalmente o trabalho dos humoristas, com frases do tipo  "... mas PRECISAVA fazer piada sobre isso?". É claro que não precisava. Por isso chamamos LIBERDADE de expressão --- não se deveria chamar "necessidade de expressão", se ela fosse necessária? Um artista ou outro cidadão qualquer optou por expressar-se de certo modo, e esta sua opção está protegida dentro de certos limites. Basta aceitarmos que alguém tenha a tarefa de dizer qual expressão é realmente necessária, e a liberdade de expressão já foi pro brejo.

Também há os defensores da expressão agradável, ou simpática. Dizem algo como ".... mas não se pode criar aborrecimento para o outro". Ora, a única expressão que precisa ser protegida é aquela com o potencial de provocar ou perturbar alguém, a expressão que alguém quer ver suprimida. A expressão daquilo com que todos concordamos e "achamos lindo" não precisa de proteção alguma.  Também é simplesmente injusto pedir a um autor que avalie, de antemão, o possível efeito de seu discurso, em qualquer interpretação, sobre todos os terráqueos. Se esse é o critério, a liberdade de expressão vira imediatamente uma utopia.

Não há espaço para dúvidas aqui. Esses dois discursos são contrários à liberdade de expressão,  em qualquer interpretação razoável  que tal conceito venha a ter. São uma apologia, ainda que envergonhada, da censura. Confunde-se, imagino, defender a liberdade de expressão e aprovar uma ideia ou manifestação especifica.  Eu posso repudiar um texto ou um filme, uma música ou um show, e nem preciso justificar meu repúdio. Mas outros adultos da sociedade devem apreciar essa expressão sem a minha interferência ou proibição. Nada mais, nada menos.

Então não há limites? Ora, há muitos limites, mais do que haveria espaço para discutir neste canal. A liberdade de expressão não pode servir de desculpa para incitar ou planejar o crime, para intimidar ou ameaçar o outro, apenas para citar alguns exemplos.  Em alguns casos, a linha que limita este direito em favor de outros não menos importantes é absolutamente clara. Para os casos em que a linha seja discutível, os tribunais estão abertos, e seus ocupantes bem pagos. Mas em nenhum caso o indivíduo deveria ter que provar a necessidade ou a simpatia de sua expressão.